sábado, setembro 29, 2007
CAPITÃO NASCIMENTO PRA PRESIDENTE?
Tropa de elite é a coqueluche nacional. Todos só falam do filme. Todos têm opinião sobre o filme. Um dos méritos desse filme foi trazer os debates sobre tráfico de droga, pirataria e violência urbana para a ordem do dia.
Tropa de elite é o novo filme do José Padilha, o mesmo diretor de do excelente documentário Ônibus 174. No primeiro filme, o diretor tentou compreender a origem da violência de Sandro Nascimento, o rapaz que sequestrou o ônibus 174, naquele dia dos namorados de 2000. No segundo filme, tenta entender o ponto de vista de um policial (não aleatoriamente chamado de capitão Nascimento) e como a violência produzida por este é racionalizada e legitimada. Creio que os dois filmes devem ser assistidos juntos, pois a proposta de Padilha é fornecer diferentes prismas sobre a mesma tragédia.
O que mais me interessa no filme é a escolha do foco narrativo, e como essa escolha se revelou bem sucedida e cheias de consequências intrigantes. O filme é narrado pelo ponto de vista do capitão Nascimento, que desgastado pela profissão, pretende escolher o seu sucessor no comando de um dos pelotões do BOPE. A visão crítica e devastadora que o capitão tem da polícia convencional serve como estratégia de diferenciação em relação a essa polícia corrupta e falida. O BOPE é feito de homens vocacionados, honestos, que acreditam no seu trabalho, são contra o tráfico e querem de fato pacificar a cidade, e não alimentar a violência - como seria o caso da polícia convencional. Todo esse cenário é construído de maneira muito persuasiva, por meio de várias ações do filme. Não temos dúvida que o policial é idealista e quer fazer o seu trabalho , ainda que e para isso tenha que pagar um alto custo pela sua saúde e pelo fim de sua vida afetiva. Sua abnegação é espartana. A retórica do filme é eficiente e quando capitão Nascimento, na sua caçada pelo traficante Baiano, começa a torturar as pessoas, já sabemos de que lado estamos.
Soube que em algumas salas de cinema o público chega a vibrar e bater palmas diante das cenas de tortura. Alguns articulistas da esquerda bem pensante chegaram a chamar o filme de fascista por "estimular" esse tipo de reação. A questão, no entanto é mais profunda. A ação do capitão Nascimento de torturar para "fazer o bem" e a reação de exaltação do público fazem parte de uma mesma totalidade social. O filme, nesse sentido, serve como espelho rachado de uma sociedade em crise.
Se a intenção é fazer o bem, por que se importar com os métodos truculentos? O público que aplaudia o BOPE antes do filme ser lançado, havia assistido ao filme pirateado. Cansados de tanta violência, haviam eles mesmos alimentado outra indústria criminosa, mas seria, na opinião deles, um crime menor, como é um crime menor e perdoável, a tortura do capitão Nascimento em busca de justiça. O problema, no entanto, é que no Brasil alguns crimes são crimes de verdade, outros são crimes que, como diria Lula (o principal guardião da constituição brasileira) em relação ao caixa 2, "todo mundo faz". Algumas leis "pegam", outras nem tanto. Sou contra maconheiro, mas pirateio DVD. Há uma relação bastante peculiar entre norma e transgressão nesse país. E o filme e sua recepção "pirateada" mostram com grande acuidade essa relação leniente e flexível entre norma e trangressão.
E há os esquerdistas bem pensantes que acusam o filme de fascista. Mas a esquerda também não tem os seus capitães Nascimento? A cúpula do governo Lula caiu por casos graves de corrupção, mas se alguém se atreve a tocar nessa questão é acusado de "moralismo udenista". Só o moralismo de classe média não entende que foi esse o governo mais popular da história do Brasil, que distribuiu mais renda para os do andar de baixo. Os métodos mensalônicos são "crimes que todo mundo faz". Lula teve que jogar dentro das regras do jogo para, no final, fazer o bem. Foi comemorado na última semana os 40 anos da morte de Che Guevara. Guevara organizou maior parte das execuções em Cuba, muitas delas ritos sumários. Mas para quem questiona esse lado do humanista Guevara, logo aprende que ele tinha um belo ideal de justiça, que lutou pelo socialismo e por um mundo mais igual. Que tenha se sujado de sangue, que soldado não faz isso? Se o discurso maquiavélico de que os fins justificam os meios serve para relativizar os mal feitos de Lula e Guevara, por que não serviria para o capitão Nascimento?
Creio que essa é uma das questões principais do filme, potencializadas pela recepção peculiar que teve. No fim, o filme também traz um debate ético: de como agir numa cultura permissiva como a brasileira. O que é aceitável e o que não é aceitável em nossas ações, o que é norma e o que é transgressão da norma. E esse debate, creio, não deve se restringir aos policiais militares.
Tropa de elite é a coqueluche nacional. Todos só falam do filme. Todos têm opinião sobre o filme. Um dos méritos desse filme foi trazer os debates sobre tráfico de droga, pirataria e violência urbana para a ordem do dia.
Tropa de elite é o novo filme do José Padilha, o mesmo diretor de do excelente documentário Ônibus 174. No primeiro filme, o diretor tentou compreender a origem da violência de Sandro Nascimento, o rapaz que sequestrou o ônibus 174, naquele dia dos namorados de 2000. No segundo filme, tenta entender o ponto de vista de um policial (não aleatoriamente chamado de capitão Nascimento) e como a violência produzida por este é racionalizada e legitimada. Creio que os dois filmes devem ser assistidos juntos, pois a proposta de Padilha é fornecer diferentes prismas sobre a mesma tragédia.
O que mais me interessa no filme é a escolha do foco narrativo, e como essa escolha se revelou bem sucedida e cheias de consequências intrigantes. O filme é narrado pelo ponto de vista do capitão Nascimento, que desgastado pela profissão, pretende escolher o seu sucessor no comando de um dos pelotões do BOPE. A visão crítica e devastadora que o capitão tem da polícia convencional serve como estratégia de diferenciação em relação a essa polícia corrupta e falida. O BOPE é feito de homens vocacionados, honestos, que acreditam no seu trabalho, são contra o tráfico e querem de fato pacificar a cidade, e não alimentar a violência - como seria o caso da polícia convencional. Todo esse cenário é construído de maneira muito persuasiva, por meio de várias ações do filme. Não temos dúvida que o policial é idealista e quer fazer o seu trabalho , ainda que e para isso tenha que pagar um alto custo pela sua saúde e pelo fim de sua vida afetiva. Sua abnegação é espartana. A retórica do filme é eficiente e quando capitão Nascimento, na sua caçada pelo traficante Baiano, começa a torturar as pessoas, já sabemos de que lado estamos.
Soube que em algumas salas de cinema o público chega a vibrar e bater palmas diante das cenas de tortura. Alguns articulistas da esquerda bem pensante chegaram a chamar o filme de fascista por "estimular" esse tipo de reação. A questão, no entanto é mais profunda. A ação do capitão Nascimento de torturar para "fazer o bem" e a reação de exaltação do público fazem parte de uma mesma totalidade social. O filme, nesse sentido, serve como espelho rachado de uma sociedade em crise.
Se a intenção é fazer o bem, por que se importar com os métodos truculentos? O público que aplaudia o BOPE antes do filme ser lançado, havia assistido ao filme pirateado. Cansados de tanta violência, haviam eles mesmos alimentado outra indústria criminosa, mas seria, na opinião deles, um crime menor, como é um crime menor e perdoável, a tortura do capitão Nascimento em busca de justiça. O problema, no entanto, é que no Brasil alguns crimes são crimes de verdade, outros são crimes que, como diria Lula (o principal guardião da constituição brasileira) em relação ao caixa 2, "todo mundo faz". Algumas leis "pegam", outras nem tanto. Sou contra maconheiro, mas pirateio DVD. Há uma relação bastante peculiar entre norma e transgressão nesse país. E o filme e sua recepção "pirateada" mostram com grande acuidade essa relação leniente e flexível entre norma e trangressão.
E há os esquerdistas bem pensantes que acusam o filme de fascista. Mas a esquerda também não tem os seus capitães Nascimento? A cúpula do governo Lula caiu por casos graves de corrupção, mas se alguém se atreve a tocar nessa questão é acusado de "moralismo udenista". Só o moralismo de classe média não entende que foi esse o governo mais popular da história do Brasil, que distribuiu mais renda para os do andar de baixo. Os métodos mensalônicos são "crimes que todo mundo faz". Lula teve que jogar dentro das regras do jogo para, no final, fazer o bem. Foi comemorado na última semana os 40 anos da morte de Che Guevara. Guevara organizou maior parte das execuções em Cuba, muitas delas ritos sumários. Mas para quem questiona esse lado do humanista Guevara, logo aprende que ele tinha um belo ideal de justiça, que lutou pelo socialismo e por um mundo mais igual. Que tenha se sujado de sangue, que soldado não faz isso? Se o discurso maquiavélico de que os fins justificam os meios serve para relativizar os mal feitos de Lula e Guevara, por que não serviria para o capitão Nascimento?
Creio que essa é uma das questões principais do filme, potencializadas pela recepção peculiar que teve. No fim, o filme também traz um debate ético: de como agir numa cultura permissiva como a brasileira. O que é aceitável e o que não é aceitável em nossas ações, o que é norma e o que é transgressão da norma. E esse debate, creio, não deve se restringir aos policiais militares.
segunda-feira, setembro 17, 2007
A REALIDADE É MAIS COMPLEXA
Por favor, leiam esse trecho da reportagem da Veja:
Na última segunda-feira, José Dirceu despachou do exterior um fax a seu escritório em São Paulo. No fax, procura desmentir a reportagem da edição passada de VEJA e diz que as informações são "fantasiosas, infundadas e irresponsáveis". Na sexta-feira, Dirceu deu entrevistas aos jornais dizendo que é um "absurdo" uma revista "enxovalhar" a "honra e a dignidade de uma pessoa" sem mostrar nenhuma prova e nem mesmo identificar as testemunhas. É uma prática do jornalismo publicar informações sem identificar a fonte, desde que se confie em sua credibilidade. Mas, atendendo à angústia de Dirceu, VEJA consultou suas fontes para saber se estavam dispostas a revelar sua identidade. Das quatro pessoas ouvidas para a confecção da matéria, três concordaram com a idéia. Portanto, ei-las: uma é o empresário Leon Sayeg, 41 anos, que trabalha na área de construção civil em São Paulo. A outra é seu sócio, Omar Jahic, 42 anos. A terceira é um sindialista carioca, Alberto Antunes, 47 anos, velho conhecido de Dirceu
Luís Nassif, um jornalista reconhecidamente equilibrado, chamou essa reportagem da Veja como um exemplo de antijornalismo.
Bem, agora troquem "Dirceu" por Cacciola, "sindicalista carioca" por operador de mercado, São Paulo por Rio de Janeiro, e vocês lerão a reportagem da Veja de de 21 de abril de 1999. O julgamento de Nassif é o mesmo. As manchetes da Veja naquela semana era:
"Inconfidências de Cacciola"
A interlocutores ouvidos por VEJA o banqueiro contou que
- Tinha informante na alta cúpula do Banco Central
- Seu banco, o Marka, e outras três instituições pagavam 125 000 dólares cada um, por mês, ao tal informante do BC. Cacciola nunca comprovou nenhum depósito ou pagamento
- Tem uma fita em que se comprovaria a história do informante no Banco Central. Cacciola não mostra a fita
- O Marka foi à lona porque seu informante não soube, a tempo de avisá-lo, da mudança cambial iniciada em 13 de janeiro.
Naquela época quem adorou a reportagem foi José Dirceu, Mercadante e caterva. Ninguém chamou a Veja de golpista, de imprensa sensacionalista, de estarem atingindo o Bacen para atingir o presidente da República. Nassif, diga-se de passagem, desde aquela época, condenava os procedimentos da revista.
Da parte de alguns articulistas tucanos, há uma imagem de que o PSDB é o partido de classe média urbana, dos leitores de jornal, como que criando um crivo entre classe média urbana e povão dos rincões. Essa dicotomia é totalmente falsa. Tanto é que na última pesquisa presidencial, José Serra liderava em todos segmentos sociais, em todas regiões do país (inclusive Nordeste) e seu pior resultado era exatamente nas pessoas de curso superior (exatamente na tal classe média letrada e urbana da qual tanto se jactam os tucanos).
São inúmeros os casos concretos que desconstroem muito do discurso reinante nas chamadas análises políticas que gracejam por aí.
Por favor, leiam esse trecho da reportagem da Veja:
Na última segunda-feira, José Dirceu despachou do exterior um fax a seu escritório em São Paulo. No fax, procura desmentir a reportagem da edição passada de VEJA e diz que as informações são "fantasiosas, infundadas e irresponsáveis". Na sexta-feira, Dirceu deu entrevistas aos jornais dizendo que é um "absurdo" uma revista "enxovalhar" a "honra e a dignidade de uma pessoa" sem mostrar nenhuma prova e nem mesmo identificar as testemunhas. É uma prática do jornalismo publicar informações sem identificar a fonte, desde que se confie em sua credibilidade. Mas, atendendo à angústia de Dirceu, VEJA consultou suas fontes para saber se estavam dispostas a revelar sua identidade. Das quatro pessoas ouvidas para a confecção da matéria, três concordaram com a idéia. Portanto, ei-las: uma é o empresário Leon Sayeg, 41 anos, que trabalha na área de construção civil em São Paulo. A outra é seu sócio, Omar Jahic, 42 anos. A terceira é um sindialista carioca, Alberto Antunes, 47 anos, velho conhecido de Dirceu
Luís Nassif, um jornalista reconhecidamente equilibrado, chamou essa reportagem da Veja como um exemplo de antijornalismo.
Bem, agora troquem "Dirceu" por Cacciola, "sindicalista carioca" por operador de mercado, São Paulo por Rio de Janeiro, e vocês lerão a reportagem da Veja de de 21 de abril de 1999. O julgamento de Nassif é o mesmo. As manchetes da Veja naquela semana era:
"Inconfidências de Cacciola"
A interlocutores ouvidos por VEJA o banqueiro contou que
- Tinha informante na alta cúpula do Banco Central
- Seu banco, o Marka, e outras três instituições pagavam 125 000 dólares cada um, por mês, ao tal informante do BC. Cacciola nunca comprovou nenhum depósito ou pagamento
- Tem uma fita em que se comprovaria a história do informante no Banco Central. Cacciola não mostra a fita
- O Marka foi à lona porque seu informante não soube, a tempo de avisá-lo, da mudança cambial iniciada em 13 de janeiro.
Naquela época quem adorou a reportagem foi José Dirceu, Mercadante e caterva. Ninguém chamou a Veja de golpista, de imprensa sensacionalista, de estarem atingindo o Bacen para atingir o presidente da República. Nassif, diga-se de passagem, desde aquela época, condenava os procedimentos da revista.
Da parte de alguns articulistas tucanos, há uma imagem de que o PSDB é o partido de classe média urbana, dos leitores de jornal, como que criando um crivo entre classe média urbana e povão dos rincões. Essa dicotomia é totalmente falsa. Tanto é que na última pesquisa presidencial, José Serra liderava em todos segmentos sociais, em todas regiões do país (inclusive Nordeste) e seu pior resultado era exatamente nas pessoas de curso superior (exatamente na tal classe média letrada e urbana da qual tanto se jactam os tucanos).
São inúmeros os casos concretos que desconstroem muito do discurso reinante nas chamadas análises políticas que gracejam por aí.
sábado, setembro 01, 2007
SEM LUZ NO FIM DO TÚNEL
(http://noendinsightmovie.com/)
Esse é um documentário devastador. Esse filme relata como o governo americano foi assaltado por um grupo de lunáticos belicistas, que no afã de ir à guerra, desconsideraram o conhecimento técnico e a experiência de agentes da inteligência, militares e diplomatas norte-americanos. É um documentário sobre a mistura de má-fé, incompetência, amadorismo e convicções cegas que levou os Estados Unidos a lutar uma guerra completamente irracional e bastante compromentedora para a sua própria segurança.
Todos já sabem mais ou menos como as justificativas para guerra foram forjadas. O que esse documentário mostra é como a operação pós-guerra foi "montada". Todos entrevistados, com exceção de uns poucos professores universitários, foram pessoas que estiveram no comando dessa operação: militares, funcionários da CIA, do Departamento do Estado. E isso é o mais chocante: ouvir uma história contada não por um esquerdista extremado de Berkeley, mas pelos próprios tecnocratas norte-americanos.
Na primeira parte, há um depoimento de um analista de inteligência que lembra que já no dia 12 de setembro de 2001, havia ordens da Casa Banca para tentar achar uma ligação entre Al Quaeda e Saddam. Nada foi encontrado. Depois havia a polêmica de quantos homens seriam necessários para invadir e controlar o Iraque. Os generais mais experientes avaliavam que 700 mil seria um número realista. Rumsfeld defendia que essa seria uma guerra moderna, e que com a tecnologia que os EUA tinham à disposição, poucos homens seriam usados. Acabaram levando 160 mil homens. O resultado foi desastroso. Não havia homens suficientes para vigiar os armazéns de armas nem para policiar as cidades.
Logo depois da invasão, o Iraque passou a sofrer uma onda de roubos e saques, que tornou o país um caos completo. Os soldados não receberam ordem alguma para evitar os saques. Os americanos assistiam impassivos à desordem. Dois meses depois da invasão, o Iraque encontrava-se em estado de anomia, sem poder constituído nem justiça para regular a vida social. Mas as coisas tornaram-se ainda piores.
Um tal de Paul Bremmer assume o comando da operação no Iraque e toma duas decisões que se revelarão catastróficas: (1) Retira do governo iraquiano todos os membros do Partido de Saddam (Ba´ha), isto é, demite 50 mil funcionários, professores, burocratas, que administravam o país na época de Saddam. Em vez de aproveitar o conhecimento desses funcionários - que obviamente ingressaram no Partido por pressão política de um ditador -, Bremmer resolveu defenestrá-los e tirá-los do processo de reconstrução. (2) A outra decisão foi acabar com o Exército, a guarda especial e a inteligência do Iraque. De uma hora pra outra mais de 100 mil soldados, espiões e policiais ficaram sem emprego. O burocrata americano simplesmente mandou para casa os homens armados do país. Os homens que tinham informações estratégicas sobre as questões mais sensíveis no que diz respeito à segurança, num país mergulhado no caos, na crise econômica e social. Enfim, Paul Bremmer conseguiu piorar a situação e fazer do Iraque uma verdadeira caixa de Pandora, um país balcanizado, uma fábrica de insurgentes munidos de armas e bombas até os dentes.
No end in sight mostra como a plutocracia republicana, surfando na retórica do medo, fez o que bem quis e o que bem entendeu, descartando avisos e precauções, colocando os Estados Unidos numa guerra sangrenta e deixando o país ainda mais inseguro que antes.
(http://noendinsightmovie.com/)
Esse é um documentário devastador. Esse filme relata como o governo americano foi assaltado por um grupo de lunáticos belicistas, que no afã de ir à guerra, desconsideraram o conhecimento técnico e a experiência de agentes da inteligência, militares e diplomatas norte-americanos. É um documentário sobre a mistura de má-fé, incompetência, amadorismo e convicções cegas que levou os Estados Unidos a lutar uma guerra completamente irracional e bastante compromentedora para a sua própria segurança.
Todos já sabem mais ou menos como as justificativas para guerra foram forjadas. O que esse documentário mostra é como a operação pós-guerra foi "montada". Todos entrevistados, com exceção de uns poucos professores universitários, foram pessoas que estiveram no comando dessa operação: militares, funcionários da CIA, do Departamento do Estado. E isso é o mais chocante: ouvir uma história contada não por um esquerdista extremado de Berkeley, mas pelos próprios tecnocratas norte-americanos.
Na primeira parte, há um depoimento de um analista de inteligência que lembra que já no dia 12 de setembro de 2001, havia ordens da Casa Banca para tentar achar uma ligação entre Al Quaeda e Saddam. Nada foi encontrado. Depois havia a polêmica de quantos homens seriam necessários para invadir e controlar o Iraque. Os generais mais experientes avaliavam que 700 mil seria um número realista. Rumsfeld defendia que essa seria uma guerra moderna, e que com a tecnologia que os EUA tinham à disposição, poucos homens seriam usados. Acabaram levando 160 mil homens. O resultado foi desastroso. Não havia homens suficientes para vigiar os armazéns de armas nem para policiar as cidades.
Logo depois da invasão, o Iraque passou a sofrer uma onda de roubos e saques, que tornou o país um caos completo. Os soldados não receberam ordem alguma para evitar os saques. Os americanos assistiam impassivos à desordem. Dois meses depois da invasão, o Iraque encontrava-se em estado de anomia, sem poder constituído nem justiça para regular a vida social. Mas as coisas tornaram-se ainda piores.
Um tal de Paul Bremmer assume o comando da operação no Iraque e toma duas decisões que se revelarão catastróficas: (1) Retira do governo iraquiano todos os membros do Partido de Saddam (Ba´ha), isto é, demite 50 mil funcionários, professores, burocratas, que administravam o país na época de Saddam. Em vez de aproveitar o conhecimento desses funcionários - que obviamente ingressaram no Partido por pressão política de um ditador -, Bremmer resolveu defenestrá-los e tirá-los do processo de reconstrução. (2) A outra decisão foi acabar com o Exército, a guarda especial e a inteligência do Iraque. De uma hora pra outra mais de 100 mil soldados, espiões e policiais ficaram sem emprego. O burocrata americano simplesmente mandou para casa os homens armados do país. Os homens que tinham informações estratégicas sobre as questões mais sensíveis no que diz respeito à segurança, num país mergulhado no caos, na crise econômica e social. Enfim, Paul Bremmer conseguiu piorar a situação e fazer do Iraque uma verdadeira caixa de Pandora, um país balcanizado, uma fábrica de insurgentes munidos de armas e bombas até os dentes.
No end in sight mostra como a plutocracia republicana, surfando na retórica do medo, fez o que bem quis e o que bem entendeu, descartando avisos e precauções, colocando os Estados Unidos numa guerra sangrenta e deixando o país ainda mais inseguro que antes.