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terça-feira, outubro 26, 2004

AGUENTA CORAÇÃO

Não dá pra falar em outro assunto, sobretudo nesta semana. Tem que ser política mesmo. No Brasil, haverá eleições ,neste próximo domingo, para prefeito nas cidades onde a disputa foi para o segundo turno. Não deverá haver novidade: José Serra vai ganhar fácil em São Paulo, Luzianne (a sensação da onda loura do PT) deverá ser a nova prefeita de Fortaleza, e há a possibilidade do PT perder tanto em Curitiba como em Porto Alegre, mas a disputa ainda está muito acirrada para falar sobre um vencedor.
Já aqui, nos EUA, o suspense é geral. As pessoas andam nervosas aqui -- nunca uma eleição esteve tão aberta, tão imprevisível, uma disputa tão acirrada. E nunca a torcida foi tão intensa. Como moro na Califórnia, especificamente na área de San Francisco, não precisa nem dizer que a torcia por aqui é generealizada a favor de Kerry. Todos aqui são Kerry desde criancinha. Os debates trouxeram uma nova onde otimismo. Antes, a vitória de Bush era tida como certa. Agora há uma certa esperança no ar. Kerry precisa vencer Ohio e Flórida para garantir a vitória (aliás, quem levar os dois estados no colégio eleitoral, vence a eleição). Estados difíceis. Ninguém se atraveria a prever quem vai ganhar os votos destes estados.
A vitória vai ser decidida voto a voto e suspeito que vai ter muita confusão e batalha legal, cada partido querendo impugnar urnas favoráveis ao outro. Bem, quem viver verá. A vitória de Kerry já não é mais um wishful thinking. Pode, de fato, acontecer...

PS- Para acompanhar o placar de cada estado, basta acessar esta página do NYT (http://www.nytimes.com/packages/html/politics/2004_ELECTIONGUIDE_GRAPHIC/)

domingo, outubro 17, 2004

POST POLÍTICO - ou como Esaú e Jacó ajudam a entender o Brasil.

Outro dia desse, fiz um comentário no blogue de Ricardo Noblat (http://noblat.blig.ig.com.br), que considero ser um dos blogues políticos mais interessantes do Brasil. Ele acabou publicando meu comentário num post seu (sob o título "Cara de um, fucinho do outro"). Aqui vai:

Já se falou de Adeus Lênin como metáfora para se entender o cenário político tão peculiar que o Brasil está vivendo hoje, mas acredito que a melhor obra de arte que serviria como parâmetro para a comédia política brasileira seria o romance de Machado de Assis "Esaú e Jacó". Nele, o bruxo da Rua Cosme Velho narra a história de dois irmãos gêmeos, Pedro e Paulo. Um era monarquista, outro era republicano. Ambos se odiavam. Brigavam muito. Mas o único problema é que por mais que brigassem, eles se pareciam em tudo. Machado, nesse romance político maravilhoso, estava querendo dizer que num país onde as mudanças são só de fachadas - República e Monarquia, PSDB ou PT - a única coisa que se altera são as etiquetas. É cômico ver os petistas e os tucanos se digladiando aqui neste blogue como se os dois não tivessem rabo preso, como se os dois não fossem quase a imagem no espelho do outro.

Quando um fala do enriquecimento de Kassab, pode-se falar do enriquecimento do melhor amigo de Palloci, das merendas superfaturadas de Ribeirão Preto. Quando um fala do apoio de ACM e da Pefelândia em relação ao FHC, pode-se falar de Lula, hoje namorando o PTB de Jefferson, o PMDB do cacique Sarney. Quando um fala da política neoliberal de FH, o outro pode falar da mesma coisa em relação ao governo Lula, que tem um tucano presidindo o Banco Central. Enfim, chega a ser cômico que os tucanos e petistas aqui do blogue, tão comovidos pelo calor da eleição, não consigam perceber que são muito parecidos um com o outro

sexta-feira, outubro 15, 2004

25 ANOS

Ontem foi meu aniversário. Data de reflexão, de pensamento, de balanço.
Com 25 anos,

- meu avô já era pai de dois filhos.
- Glauber Rocha já tinha criado e dirigido Deus e o Diabo na Terra do Sol
- Emerson Fittipaldi já tinha sido campeão de F-1.
- Meu amigo Ram já tinha feito 2 mestrados (um na UFRJ outro na UT Austin)
- Orson Welles já tinha dirigido o filme Citizen Kane, que mudou o cinema.
- Marx estava escrevendo A Ideologia Alemã
- Rimbaud já havia entrado, desde muito tempo, na história da poesia ocidental.

Eu não tenho filhos, não dirigi nenhum filme, nem estou escrevendo uma grande teoria social, ou obra poética. Diria, para usar as palavras caras de Drummond, que "tenho apenas duas mãos e o sentimento do mundo", ou seja, minhas circunstâncias limitadas e minha vontade de entender e participar do mundo. Trago comigo minha afirmação da vida. E mais do que qualquer coisa é isso que deve sempre ser celebrado.



quinta-feira, outubro 07, 2004

MINHA FORMAÇÃO

"O traço de toda uma vida é para muitos um desenho de criança esquecido pelo homem, mas ao qual ele terá sempre que se cingir sem o saber" - é com essa frase, com sabor proustiano, que Joaquim Nabuco inicia o capítulo Massangana de Minha Formação, livro autobiográfico, publicado pela primeira vez em 1900. O capítulo Massangana trata da primeira infância do autor, vivida no Engenho Massangana, localizado onde hoje está a Cidade do Cabo, em Pernambuco.


Qual seria portanto o traço da vida de Nabuco e que desenho de criança teria sido o seu? O intuito do capítulo é o de entender a luta política de Joaquim Nabuco pela abolição dos escravos, a partir de sua gênese. Essa gênese estaria no engenho de Massangana, no qual Nabuco entrou em contato pela primeira com os escravos. Esse primeiro contato, essa primeira impressão - como expressa Nabuco - seria decisiva para as opções políticas que Nabuco faria no futuro. Como ele próprio relata:




Eu estava uma tarde sentado no patamar da escada exteior da casa, quando vejo precipitar-se para mim um jovem negro desconhecido, de cerca de dezoito anos, o qual se abraça a meus pés suplicando-me pelo amor de Deus que o fizesse comprar por minha madrinha para me servir. Ele vinha das vizinhanças, procurando mudar de senhor, porque o dele, dizia-me, o castigava, e ele tinha fugido com risco de vida...Foi este o traço inesperado que me descobriu a natureza da instituição com a qual eu vivera familiarmente, sem suspeitar a dor que ela ocultava.
Nabuco passa a notar o caráter caprichoso e arbitrário das relações entre senhores e escravos, onde estes últimos viviam sem nenhum direito, completamente ao sabor da boa vontade do senhores, que poderiam tratá-los quase como membro da família, ou como animais de carga. A absoluta falta de direitos garantidos permitia essa situação ambígua, na qual os escravos poderiam conhecer o "paraíso" da Casa-Grande ou o inferno das chicotadas dos feitores.
No entanto, o capítulo Massangana é mais ambiguo pois além de tentar delinear a gênese da luta política de Nabuco, traz também um certo encantamento com aquele mundo dos escravos, ou como Nabuco se refere: saudade dos escravos. Vejamos:


Assim eu combati a escravidão com todas as minhas forças, repeli-a com toda a minha consciência, como a deformação utilitária da criatura, e na hora em que a vi acabar, pensei poder pedir também minha alforrria, dizer o meu nunc dimmitis, por ter ouvida a mais bela nova que em meus dias Deus pudesse mandar ao mundo, e, no entanto, hoje que ela está extinta, experimento uma singular nostalgia, que muito espantaria um Garrison ou um John Brown: a saudade do escravo.

Nabuco elabora:


A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil. Ela espalhou por nossas vastas solidões uma grande suavidade, seu contato foi a primeira forma que recebeu a natureza virgem do país, e foi a que ele guardou, ela povoou-o como se fosse uma religião natural e viva, com os seus mitos, suas legendas, seus encantamentos, insuflou-lhe sua alma infantil, suas tristezas sem pesar, suas lágriams sem amargor, seu silêncio sem concentração, suas alegrias sem causa, sua felicidade sem dia seguinte...é ela o suspiro indefinível que exalam ao luar as nossas noites do norte(Caetano Veloso musicou este trecho no seu CD Noites do Norte)
Aqui Nabuco, cujo estilo é marcadamente sóbrio, resvala num lirismo inusitado. E parece antecipar Gilberto Freyre: reconhece os males terríveis da instituição da escravidão, mas não consegue deixar de admirar o encantamento da Senzala, que modificou radicalmente a face deste país, e fez do Brasil, Brasil - para o bem e para o mal. Como se vê, os impasses a que chega Nabuco são fascinantes e infelizmente ainda não foram suficientemente estudados. A leitura de Minha Formação, sobretudo este capítulo, é mais do que aconselhável para os que se aventuram a conhecer a cultura brasileira nos seus enredamentos mais fascinantes e intrigantes. Assim como O Abolicionismo deveria ser leitura obrigatória para todo cidadão brasileiro.


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