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domingo, setembro 26, 2004

A SITUAÇÃO TÁ PRETA...

O mapa das eleições americanas está pior do que eu poderia imaginar(http://www.nytimes.com/packages/html/politics/2004_ELECTIONGUIDE_GRAPHIC/). De acordo com as previsões do NYT, Bush tem 257 votos no Colégio Eleitoral, contra 181 de Kerry. Lembrando que para ser presidente, é necessário obter 271 votos. Ou seja, se Bush ganhar em todos os estados nos quais está frente nas pesquisas, e ganhar, por exemplo, em Nova Jersey (que tem 15 votos eleitorais e é um estado que está indeciso), a eleição é dele. Em outras palavras, a vitória está muito mais perto de Bush do que de Kerry, pelo menos hoje. Os debates irão começar, e a esperança é que Kerry reverta essa situação nos debates. Só nos resta torcer pra que haja alguma reação de Kerry até novembro.

sexta-feira, setembro 17, 2004

ESSA NEGRA FULÔ...

Sem tempo pra postar. No entanto, não vou aqui me ocupar de política, nem de trabalho. Postarei uma poesia que acho linda - Negra fulô - de Jorge de Lima. Uma pérola do modernismo nordestino. É uma espécie de Casa-Grande & Senzala em versos. A poesia é conduzida pela voz da sinhá de engenho, permitindo-se entrever de maneira condensada os grandes temas da história doméstica da família brasileira, especificamente a nordestina - temas que vão desde da febre acusatória da desonestidade da escrava, até a cooptação sexual do senhor de engenho. Temas que não estão ainda tão distantes de nossa classe média, pretensamente moderna - que ainda acusa suas empregadas de ladra - apesar de explorá-las como escravas - e, não raro, também tentam seduzi-las. Com vocês, Negra fulô...

Essa negra fulô

Ora, se deu que chegou (isso já faz muito tempo) no bangüê dum meu avô uma negra bonitinha chamada negra Fulô.
Essa negra Fulô! Essa negra Fulô!

O Fulô! ó Fulô! (Era a fala da Sinhá) - vai forrar a minha cama, pentear os meus cabelos, vem ajudar a tirar, a minha roupa, Fulô!
Essa negra Fulô!

Essa negrinha Fulô ficou logo pra mucama, pra vigiar a Sinhá pra engomar pro Sinhô!
Essa negra Fulô! Essa negra Fulô!
O Fulô! ó Fulô! (era a fala da Sinhá) vem me ajudar, ó Fulô, vem abanar o meu corpo que eu estou suada, Fulô! vem coçar minha coceira, vem me catar cafuné, vem balançar minha rêde, vem me contar uma história, que eu estou com sono, Fulô!

Essa negra Fulô!

"Era um dia uma princesa que vivia num castelo que possuia um vestido com os peixinhos do mar. Entrou na perna dum pato saiu na perna dum pinto o Rei-Sinhô me mandou que vos contasse mais cinco."

Essa negra Fulô! Essa negra Fulô!
O Fulô? ó Fulô? Vai botar para dormir êsses meninos, Fulô! "Minha mãe me penteou minha madrasta me enterrou pelos figos da figueira que o sabiá beliscou."
Essa negra Fulô! Essa negra Fulô!
Fulô? ó Fulô?

(Era a fala da Sinhá chamando a negra Fulô.) Cadê meu frasco de cheiro que teu Sinhô me mandou? - Ah! foi você que roubou! Ah! foi você que roubou!
O sinhô foi ver a negra levar couro do feitor. A negra tirou a roupa. O Sinhô disse: Fulô! (A vista se escureceu que nem a negra Fulô.)
Essa negra Fulô! Essa negra Fulô!


O Fulô? ó Fulô? Cadê meu lenço de rendas cadê meu cinto, meu broche, cadê meu terço de ouro que teu Sinhô me mandou? Ah! foi você que roubou. Ah! foi você que roubou.
Essa negra Fulô! Essa negra Fulô!
O Sinhô foi açoitar sozinho a negra Fulô. A negra tirou a saia e tirou o cabeção, de dentro dêle pulou nuinha a negra Fulô.
Essa negra Fulô! Essa negra Fulô!

O Fulô? ó Fulô? Cadê, cadê teu Sinhô que nosso Senhor me mandou? Ah! foi você que roubou, foi você, negra Fulô?
Essa negra Fulô!

sexta-feira, setembro 03, 2004

ELEIÇÕES

O salão principal estava da International House lotado hoje. Aquela pequena multidão de estudantes de Berkeley assistiam enojados a um discurso repleto de clichês e lugares comuns, que além de desinteressante, sob o ponto de vista retórica, era completamente abjeto, pelas inverdades que transmitia. Era o discurso de aceitação (da candidatura) do presidente George W. Bush. A campanha vai esquentar de vez agora.
O clima político anda muito tenso aqui nos EUA. Nunca a polarização foi tão evidente.
Isso pode ser visto pela quantidade de pessoas trabalhando pela candidatura de Kerry aqui na Califórnia. Aqui na Califórnia não costuma haver muita campanha política, pois é considerado um estado democrata (apesar de ter sido o estado natal de dois ex-presidentes republicanos, como Richard Nixon e Ronald Reagan, além de ter elegido Arnold para governador). A última vez que a Califórnia "votou" num republicano foi em 1984, na reeleição de Reagan. Sabendo dessa tendência, tanto os republicanos como os democratas preferem fazer campanha nos estados que ainda não estão decididos (chamados de swing states ou "estados pêndulos").
Mas, nessa campanha, tem-se observado um fenômeno interessante. Democratas estão nas ruas - já vi vários deles em Berkeley, Oakland e San Francisco - pedindo dinheiro que teoricamente será mandado para esses estados pêndulos. E eles certamente sabem onde estão pedindo, pois essa região daqui é uma região marcada pelo anti-bushismo. Até eu doei 10 dólares para campanha de Kerry, em San Francisco, através de um amiga americana - já que como estrangeiro não posso ajudar a financiar nenhum candidato. O irônico é isso: até os pé-rapados, como eu, estão fazendo doações. Tudo para tirar Bush da Casa-Branca.
A sensação que se tem hoje por aqui é que Kerry tem grandes possibilidades de ganhar no voto popular. Mas no Colégio Eleitoral só Deus sabe...

***

Enquanto isso no Brasil, as eleições pra prefeito estão pegando fogo. Fiquei muito feliz saber que JP avançou nas pesquisas e tem até a possibilidade de levar a eleição no primeiro turno - embora eu ache que alimentar essas esperanças na militância seja muito temerário. Por outro lado, lamento que Raul Jungman, candidato do PPS, tenha apenas 1% das intenções de voto. Acho que Jungman é um candidato sério e a cidade teria muito a ganhar se ele fosse o opositor real de JP.
Em São Paulo, a disputa está realmente imprevisível. Mas estou com a intuição que o jogo está começando a virar para Serra. Talvez seja apenas uma impressão equivocada. Analisando um pouco os candidatos e esvaziando a tensão eleitoral, típica dos militantes, devo dizer que em São Paulo os dois candidatos são bons. Marta teve boas realizações na prefeitura, como o CEU e o bilhete único. E Serra é um administrador nato. Um homem sem carisma, é verdade, mas bastante preparado tecnicamente e com uma grande vontade de trabalho.
Vamos ver quais serão as surpresas que as eleições de 2004, seja nos EUA, seja nas cidades brasileiras, nos trará.


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