quarta-feira, agosto 25, 2004
DROGAS
Marcelo levantou a questão sobre o combate das drogas. Esse é um problema que tem entrado na agenda do país - Brasil -, sobretudo face à violência crescente das nossas cidades. Muito se tem dito que a violência, sobretudo em cidades como o Rio de Janeiro e São Paulo, é relacionada com o tráfico de drogas. Apesar de ser completamente contra o consumo de drogas, devo fazer aqui o advogado do diabo e colocar uma questão: e cidades como Los Angeles e Nova Iorque, cheias de viciados em cocaína e heroína, onde o tráfico internacional tem uma clientela gorda e endinheirada? Por que essas cidades não atingem níveis de incivilidade e caos como os atingidos nas cidades brasileiras? Coloco essa questão para matizar o debate. Não acredito que haja respostas fáceis e prontas para um problema como esse.
Da mesma forma, com a mesma facilidade e esquematismo, vem os defensores do "legalize já" como se todos os problemas pudessem ser resolvidos por decreto. Alguns amigos - tanto no Brasil como nos EUA - que visitaram Amsterdã - internacionalmente conhecida como o lugar onde o consumo de drogas é aberto e permitido -, mostraram seu desapontamento com a "solução holandesa" - mórbida e depressiva.
Por outro lado, drogas como maconha, apesar de serem prejudiciais à saúde, não são em nada piores do que o álcool, por exemplo. A sociedade brasileira tem uma conivência absurda com o consumo do álcool, a ponto não só de estimulá-lo, mas de fazer desse consumo um ritual sagrado na sociabilidade tupiniquim. Beber é algo muito valorizado no Brasil. É o grande ritual de passagem dos adolescentes brasileiros - a maneira de eles se sentirem pertencentes a um mundo mais "adulto" e legal. No entanto, sabe-se muito bem o quanto o álcool pode ter de deletério, de desestruturador do meio familiar e de propiciar situações trágicas (acidentes, mortes, etc). Nada disso impede que o consumo do álcool fique livre de contestação em nossa sociedade. Ao contrário da maconha que é geralmente associada a um comportamento mais marginal - droga de marinheiro, de pária, ou de estudante comunista do CFCH.
Essa reflexão minha é mais derivada do bom senso, ou senso prático, do que uma convicção mais profunda. Há amigos meus que são entusiastas da legalização da maconha, como se esse fosse um grande movimento civil. Gente como Fernando Gabeira - pessoa e político que respeito, sobretudo agora, depois que ele rompeu muito dignamente com o PT - defende a política do corpo, no qual as pessoas devem exercer seu pleno direito de fazer com os seus corpos o que quiserem, seja a injeção de drogas, as práticas sexuais mais heterodoxas ou até a mutilação do próprio corpo. Como já disse aqui, acho que a legalização da maconha não é nenhum bicho de sete cabeças - se comparada, por exemplo, a maconha com o álcool - mas não me peça, por favor, para me engajar nessa luta. Não acredito que essa seja uma luta nobre. Considero-me um desses rapazes jurássicos, ainda simpáticos ao Projeto Iluminista. Sou daqueles que acredita na emancipação do homem pelo saber, na libertação das amarras e grilhões que as ilusões da doxa nos impõem. Lutar politicamente pelo direito de se drogar, de se evadir do real é, para mim, sintoma de uma sociedade do-dói, querendo fugir do mal-estar que é se olhar de frente. Essa não é a minha luta.
Marcelo levantou a questão sobre o combate das drogas. Esse é um problema que tem entrado na agenda do país - Brasil -, sobretudo face à violência crescente das nossas cidades. Muito se tem dito que a violência, sobretudo em cidades como o Rio de Janeiro e São Paulo, é relacionada com o tráfico de drogas. Apesar de ser completamente contra o consumo de drogas, devo fazer aqui o advogado do diabo e colocar uma questão: e cidades como Los Angeles e Nova Iorque, cheias de viciados em cocaína e heroína, onde o tráfico internacional tem uma clientela gorda e endinheirada? Por que essas cidades não atingem níveis de incivilidade e caos como os atingidos nas cidades brasileiras? Coloco essa questão para matizar o debate. Não acredito que haja respostas fáceis e prontas para um problema como esse.
Da mesma forma, com a mesma facilidade e esquematismo, vem os defensores do "legalize já" como se todos os problemas pudessem ser resolvidos por decreto. Alguns amigos - tanto no Brasil como nos EUA - que visitaram Amsterdã - internacionalmente conhecida como o lugar onde o consumo de drogas é aberto e permitido -, mostraram seu desapontamento com a "solução holandesa" - mórbida e depressiva.
Por outro lado, drogas como maconha, apesar de serem prejudiciais à saúde, não são em nada piores do que o álcool, por exemplo. A sociedade brasileira tem uma conivência absurda com o consumo do álcool, a ponto não só de estimulá-lo, mas de fazer desse consumo um ritual sagrado na sociabilidade tupiniquim. Beber é algo muito valorizado no Brasil. É o grande ritual de passagem dos adolescentes brasileiros - a maneira de eles se sentirem pertencentes a um mundo mais "adulto" e legal. No entanto, sabe-se muito bem o quanto o álcool pode ter de deletério, de desestruturador do meio familiar e de propiciar situações trágicas (acidentes, mortes, etc). Nada disso impede que o consumo do álcool fique livre de contestação em nossa sociedade. Ao contrário da maconha que é geralmente associada a um comportamento mais marginal - droga de marinheiro, de pária, ou de estudante comunista do CFCH.
Essa reflexão minha é mais derivada do bom senso, ou senso prático, do que uma convicção mais profunda. Há amigos meus que são entusiastas da legalização da maconha, como se esse fosse um grande movimento civil. Gente como Fernando Gabeira - pessoa e político que respeito, sobretudo agora, depois que ele rompeu muito dignamente com o PT - defende a política do corpo, no qual as pessoas devem exercer seu pleno direito de fazer com os seus corpos o que quiserem, seja a injeção de drogas, as práticas sexuais mais heterodoxas ou até a mutilação do próprio corpo. Como já disse aqui, acho que a legalização da maconha não é nenhum bicho de sete cabeças - se comparada, por exemplo, a maconha com o álcool - mas não me peça, por favor, para me engajar nessa luta. Não acredito que essa seja uma luta nobre. Considero-me um desses rapazes jurássicos, ainda simpáticos ao Projeto Iluminista. Sou daqueles que acredita na emancipação do homem pelo saber, na libertação das amarras e grilhões que as ilusões da doxa nos impõem. Lutar politicamente pelo direito de se drogar, de se evadir do real é, para mim, sintoma de uma sociedade do-dói, querendo fugir do mal-estar que é se olhar de frente. Essa não é a minha luta.
segunda-feira, agosto 23, 2004
MARIA FULL OF GRACE
Assisiti a um filme que poderia dizer, no mínimo, que é muito interessante - chama-se Maria Full of Grace. O diretor é colombiano e a temática está ligada à trajetória irregular da mulas do tráfico de drogas internacional. Maria é uma jovem colombiana, que vive numa região rural do país. Depois de ficar desempregada, recebe um convite irrecusável - levar drogas para os EUA em troca de uma bagatela para ela inimaginável de ser conquistada simplesmente pelo seu árduo trabalho. Para realizar essa atividade ela deve engolir as cápsulas de cocaína. No total, são umas sessenta cápsulas.
O filme é fascinante porque trata do assunto de uma maneira sem maniqueísmos ou esquematismos ideológicos. Uma das frases que estão na propaganda do filme é: filme baseado em mais de 1000 histórias reais - para indicar o caráter recorrente do fenômeno. O curioso é que fui assistir a esse filme com uma amiga colombiana. Obviamente ela ficou muito impactada, mas adorou o filme, dizendo que casos como aquele eram muito comuns na sociedade colombiana, sobretudo entre os colombiados pertencentes ao andar de baixo.
Assisiti a um filme que poderia dizer, no mínimo, que é muito interessante - chama-se Maria Full of Grace. O diretor é colombiano e a temática está ligada à trajetória irregular da mulas do tráfico de drogas internacional. Maria é uma jovem colombiana, que vive numa região rural do país. Depois de ficar desempregada, recebe um convite irrecusável - levar drogas para os EUA em troca de uma bagatela para ela inimaginável de ser conquistada simplesmente pelo seu árduo trabalho. Para realizar essa atividade ela deve engolir as cápsulas de cocaína. No total, são umas sessenta cápsulas.
O filme é fascinante porque trata do assunto de uma maneira sem maniqueísmos ou esquematismos ideológicos. Uma das frases que estão na propaganda do filme é: filme baseado em mais de 1000 histórias reais - para indicar o caráter recorrente do fenômeno. O curioso é que fui assistir a esse filme com uma amiga colombiana. Obviamente ela ficou muito impactada, mas adorou o filme, dizendo que casos como aquele eram muito comuns na sociedade colombiana, sobretudo entre os colombiados pertencentes ao andar de baixo.
segunda-feira, agosto 16, 2004
OS ÚLTIMOS DIAS DE FÉRIAS
Enquanto isso, vou aproveitando o final de minhas férias numa ensolarada Califórnia. A temperatura é ideal (23 o C), o céu é de brigadeiro, o vento é agradável. Não posso reclamar do clima atual.
Apesar de estar morando na International House, não dá pra sentir, infelizmente, nenhum espírito olímpico, como seria de esperar. Isso acontece porque a casa está vazia, com apenas algumas poucas almas circulando em seus corredores e comendo a sua comida tétrica. Vi ontem alguns americanos comemorando a derrota do Dream Team pra o time Porto Rico. Isso pode ser estranho, mas como estamos em Berkeley, há americanos que torcem contra os EUA, por motivos políticos.
No mais, estou trabalhando na minha dissertação - tentando poli-la com intuito de, talvez, publicá-la. Por isso que não tenho aparecido muito no blogue. É isso.
Enquanto isso, vou aproveitando o final de minhas férias numa ensolarada Califórnia. A temperatura é ideal (23 o C), o céu é de brigadeiro, o vento é agradável. Não posso reclamar do clima atual.
Apesar de estar morando na International House, não dá pra sentir, infelizmente, nenhum espírito olímpico, como seria de esperar. Isso acontece porque a casa está vazia, com apenas algumas poucas almas circulando em seus corredores e comendo a sua comida tétrica. Vi ontem alguns americanos comemorando a derrota do Dream Team pra o time Porto Rico. Isso pode ser estranho, mas como estamos em Berkeley, há americanos que torcem contra os EUA, por motivos políticos.
No mais, estou trabalhando na minha dissertação - tentando poli-la com intuito de, talvez, publicá-la. Por isso que não tenho aparecido muito no blogue. É isso.
quinta-feira, agosto 05, 2004
DE VOLTA PARA OS EUA
Volto para os Estados Unidos depois de dois meses de férias. Dei-me férias e também dei férias para esse blogue, para a alegria de seus fiéis três leitores.
Voltei triste. Nunca fui para os Estados Unidos tão macambúzio como dessa última vez. No entanto, os deuses da aviação comercial conspiravam a meu favor e me deram um assento (free upgrade) na classe executiva da Varig. Recebi com prazer esse presente aleatório e pude, pela primeira vez na minha vida, desfrutar de todos as regalias grã-burguesas inerentes a essa classe. A sociedade de classes ainda vai existir por muito tempo, sobretudo no reino da aviação comercial. Mas não se esqueçam, proletários da classe econômica, que nós não temos nada a perder, a não ser os grilhões daquelas cadeiras apertadas. A revolução tem que começar já. Deveríamos invadir a cozinha da classe executiva e da primeira classe, e distribuir salmão para todos. Salmão com farofa - eis a receita do socialismo aeroviário. Enquanto minha utopia não se concretiza, posso lhes garantir, que a grã-burguesia dos ares vai vivendo muito bem com suas poltronas acolchoadas.
No domingo fui assistir ao documentário de Michael Moore. Resisto a classificá-lo como documentário. Tarantino acerta quando o chama de ensaio político. Assisti a Bowling for Columbine e achei em alguns aspectos sensacionalista. Em Fahrenheit 9/11 pude observar um Moore mais depurado, indo direito ao ponto, detentor de uma aparelhagem retórica mais sólida e sofisticada. O filme é muito bom. Fiquei impressionado com o fato de também ser um sucesso de crítica. Jornais durões como New Yort Times, San Francisco Chronicle e Chicago Tribune cobriram de elogios o filme de Moore. Para mim, o grande mérito do filme é sua estratégia retórica de separar a política republicana dos EUA. Ele separa a política de Bush do povo americano. Mostra os motivos obscenos que levaram o governo americano a fazer sua guerrinha e como esse mesmo governo tem manipulado as versões da realidade. Uma das coisas que Bush tenta sempre fazer é associar qualquer crítica feita à sua política ao anti-americanismo - ao ódio que os não-americanos têm da "liberdade" americana. Essa é uma estratégia que dá certo, pois o americano médio sempre tende a interpretar a animosidade em relação às decisões de Bush como se fosse uma ojeriza ao próprio EUA. Moore mostra a plutocracia por trás do governo Bush e quem é o pobre americano que vai servir de bucha de canhão no Iraque.
Enfim, é um filme que vale a pena ser assistido e discutido.
Volto para os Estados Unidos depois de dois meses de férias. Dei-me férias e também dei férias para esse blogue, para a alegria de seus fiéis três leitores.
Voltei triste. Nunca fui para os Estados Unidos tão macambúzio como dessa última vez. No entanto, os deuses da aviação comercial conspiravam a meu favor e me deram um assento (free upgrade) na classe executiva da Varig. Recebi com prazer esse presente aleatório e pude, pela primeira vez na minha vida, desfrutar de todos as regalias grã-burguesas inerentes a essa classe. A sociedade de classes ainda vai existir por muito tempo, sobretudo no reino da aviação comercial. Mas não se esqueçam, proletários da classe econômica, que nós não temos nada a perder, a não ser os grilhões daquelas cadeiras apertadas. A revolução tem que começar já. Deveríamos invadir a cozinha da classe executiva e da primeira classe, e distribuir salmão para todos. Salmão com farofa - eis a receita do socialismo aeroviário. Enquanto minha utopia não se concretiza, posso lhes garantir, que a grã-burguesia dos ares vai vivendo muito bem com suas poltronas acolchoadas.
No domingo fui assistir ao documentário de Michael Moore. Resisto a classificá-lo como documentário. Tarantino acerta quando o chama de ensaio político. Assisti a Bowling for Columbine e achei em alguns aspectos sensacionalista. Em Fahrenheit 9/11 pude observar um Moore mais depurado, indo direito ao ponto, detentor de uma aparelhagem retórica mais sólida e sofisticada. O filme é muito bom. Fiquei impressionado com o fato de também ser um sucesso de crítica. Jornais durões como New Yort Times, San Francisco Chronicle e Chicago Tribune cobriram de elogios o filme de Moore. Para mim, o grande mérito do filme é sua estratégia retórica de separar a política republicana dos EUA. Ele separa a política de Bush do povo americano. Mostra os motivos obscenos que levaram o governo americano a fazer sua guerrinha e como esse mesmo governo tem manipulado as versões da realidade. Uma das coisas que Bush tenta sempre fazer é associar qualquer crítica feita à sua política ao anti-americanismo - ao ódio que os não-americanos têm da "liberdade" americana. Essa é uma estratégia que dá certo, pois o americano médio sempre tende a interpretar a animosidade em relação às decisões de Bush como se fosse uma ojeriza ao próprio EUA. Moore mostra a plutocracia por trás do governo Bush e quem é o pobre americano que vai servir de bucha de canhão no Iraque.
Enfim, é um filme que vale a pena ser assistido e discutido.